RAZÕES PELAS QUAIS TODA IGREJA PRECISA REVISAR OS SEUS ESTATUTOS
Cada vez mais, as atividades desenvolvidas por nossas igrejas são regulamentadas pelas autoridades constituídas em nossa nação. Ainda que o Estado brasileiro continue sendo considerado laico, em questões operacionais diárias de nossas instituições, o arcabouço jurídico não pode ser ignorado. Por isso, torna-se importante que nossas instituições mantenham seus estatutos atualizados e alinhados com os marcos legais que regulamentam suas atividades.
A nossa intenção é oferecer um conteúdo relevante na intenção de orientar decisões que precisam ser tomadas referentes aos documentos constitutivos. Falaremos sobre alguns assuntos que considero relevantes sobre o tema:
1. Possibilidade de inserção no estatuto de atividades típicas das Organizações da Sociedade Civil (OSC);
2. Categorias de membros diferenciadas;
3. Prestação de serviços voluntários por seus membros;
4. Previsão de possibilidade de realização de assembleias virtuais ou híbridas;
5. Verificação da necessidade de o estatuto contemplar aspectos da LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados), do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), do Estatuto da Cidade, do EI (Estatuto do Idoso) e de Direitos Autorais;
6. Versão bíblica recomendada;
7. Possibilidade de o pastor não ser o presidente da igreja;
8. Cuidados na elaboração de dispositivo que trate de questões de ordem ética, moral ou ideológica;
9. Possibilidade de aceitação de membros de outras denominações; e
10. Ampliação do mandato da diretoria estatutária.
1. POSSIBILIDADE DE INSERÇÃO NO ESTATUTO DE ATIVIDADE DE SAÚDE, EDUCAÇÃO E ASSISTÊNCIA SOCIAL, SEM RISCO DE PERDA DA IMUNIDADE TRIBUTÁRIA
Aqui abordarei alguns pontos estatutários que, a meu ver e sem a intenção de me intrometer, toda igreja deveria se preocupar, pois os tempos mudaram e com isso há um perigo iminente campeando as instituições religiosas em todos os quadrantes do nosso Brasil.
Em termos práticos, as igrejas precisam ficar mais atentas às questões legais e também se blindarem contra as astutas ciladas da camada antirreligiosa. Como se sabe, toda igreja tem por missão o que convencionamos chamar de PESCA para facilitar a assimilação, utilizando-se a primeira letra de cada palavra, a saber: Proclamação, Ensino, Serviço, Comunhão e Adoração. Pode até ser que no estatuto a redação não seja exatamente esta, mas aqui está estampada a missão precípua da igreja evangélica cristã batista brasileira. Importa frisar que quase todas as igrejas batistas já nascem com o seu braço social estendido às camadas menos favorecidas. Na medida das suas possibilidades, ou melhor, conforme o seu potencial financeiro, ela promove as suas ações sociais, que vão de fornecimento de cestas básicas, inclusão ou reinclusão social, recuperação de dependentes químicos, alcoólatras, reforço escolar, encaminhamento para o mercado de trabalho etc. Com que recursos? Unicamente com os dízimos e ofertas de seus membros e eventualmente uma ou outra doação externa vinda de pessoas físicas ou jurídicas. A boa notícia é que, por força da lei que instituiu o Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil (MROSC), as igrejas e demais organizações religiosas foram por ela contempladas de forma a poderem inserir em seus estatutos atividades típicas das OSCs, como saúde, educação e assistência social, sem o risco da perda da imunidade tributária prevista em nossa Constituição Federal. Uma vez habilitadas, poderão firmar fomentos com o poder público para alavancar os seus projetos sociais. É claro que isto exige cautela, mas com o auxílio de profissionais com expertise na área do terceiro setor, as nossas igrejas poderão ir muito além em seu ideal de servir e, ao mesmo tempo, proclamar as boas novas de salvação. Muito importante frisar que caso a igreja opte por inserir tais atividades em seu estatuto não significa que ela estará obrigada a implementá-las imediatamente. Por ora, o importante é a igreja definir a área que pretende atuar e quando as condições permitirem não haverá necessidade de mexer no estatuto novamente. Afinal, isso envolve despesas e burocracia.
2. CATEGORIAS DIFERENCIADAS DE MEMBROS
Escrevo a todas às igrejas cristãs evangélicas plantadas em solo brasileiro, pois muitas delas estão vulneráveis e, portanto, correndo riscos por não terem um estatuto adequado às normas legais vigentes, tampouco blindada contra os ataques dos antirreligiosos. Eu diria que a revisão estatutária deve ser feita o quanto antes, para isso valho-me do velho e bom conselho: “Não deixe para amanhã aquilo que precisa ser feito hoje”. Quero “propor” a possibilidade de a igreja local alterar os quóruns para a realização de assembleias ou estabelecer “categorias diferenciadas de membros”, sem que isto afete o valorizado sistema de governo congregacional democrático adotado pelos batistas, por exemplo, a saber: as decisões são tomadas por todos os membros, em assembleias gerais, onde todos têm direito a voz e voto, obviamente respeitados os limites estabelecidos por lei e deliberações internas. Vamos ao ponto: Tradicionalmente, ao se filiar a uma igreja batista, automaticamente o membro passa a gozar de todas as prerrogativas, inclusive passa a compor quórum para a realização de assembleias gerais, podendo votar e ser votado para cargos, funções, comissões, representações etc. Ressalte-se que conforme previsão estatutária, existem diferentes quóruns para a realização de assembleias gerais. Dependendo da natureza do assunto, algumas assembleias podem ser realizadas com um número mínimo de membros, já outras requerem um quórum maior, principalmente aquelas que são convocadas para tratar de assuntos que só podem ser deliberados em assembleias gerais extraordinárias, como por exemplo:
a) eleição e destituição do pastor e demais ministros da igreja;
b) aquisição venda alienação ou oneração de bens imóveis;
c) reforma estatutária;
d) transferência da sede da Igreja;
e) mudança do nome da Igreja;
f) eleição, posse e exoneração dos membros da diretoria estatutária;
g) dissolução da Igreja; e
h) instituição ou alteração do Regimento Interno ou Manual Eclesiástico.
O problema é que cada vez mais as assembleias gerais vêm sendo esvaziadas e é de se supor que muitas decisões estejam sendo tomadas sem o quorum correspondente, o que caracteriza uma irregularidade. Parece que os crentes desta geração não têm interesse em participar de processos decisórios e não querem participar de eventuais polêmicas que surgem vez ou outra em ambiente de assembleia, quando muitas decisões são tomadas em clima não amistoso. Sendo assim, o ideal é que cada igreja reveja os seus quóruns, minimizando-os de forma a não impedir a igreja de avançar em suas ações. Exemplo: se uma igreja prevê quorum de 2/3 dos membros para tratar de assuntos mais simples, que reduza esse quorum para 1/5 dos membros presentes. Se determinado estatuto prevê a realização de duas assembleias gerais extraordinárias, com quorum de 90%, para dissolução da igreja, lamento dizer que essa igreja criou um embaraço para si, porque nunca conseguirá quorum.
Por outro lado, sem prejuízo do seu sistema de governo, pode a igreja estabelecer categorias diferenciadas de membros, algo mais ou menos assim: a) membro votante (ou outro nome que se queira dar): aquele que ao se tornar membro da igreja opta por participar dos seus processos decisórios; e b) membro não votante: aquele que abre mão do seu direito de participar das assembleias, votando e sendo votado.
3. Verificação da necessidade de o estatuto contemplar aspectos da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), do Estatuto da Cidade, do Estatuto do Idoso (EI) e ECAD Direitos Autorais
Por se tratar de algo relativamente novo, muitas Igrejas por certo ainda ignoram a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), em vigor desde 18 de setembro de 2020, e por isso estão correndo grandes e sérios riscos. Enquanto refletia sobre o impacto desta lei no quotidiano das Igrejas e demais organizações religiosas, fui pesquisar na grande rede e encontrei apenas um artigo, de autoria de Marcelo Rateiro, pastor, advogado e membro do Conselho Jurídico da Convenção Batista do Estado de São Paulo, a quem eu cumprimento cordialmente. Essa lei “dispõe sobre o tratamento de dados pessoais, inclusive nos meios digitais, por pessoa natural ou por pessoa jurídica de direito público ou privado, com o objetivo de proteger os direitos fundamentais de liberdade e de privacidade e o livre desenvolvimento da personalidade da pessoa natural”. Ora, por que as Igrejas, enquanto ambientes de aglomeração de pessoas, estariam desobrigadas do cumprimento dessa lei? É nos espaços eclesiásticos que a privacidade das pessoas desaparece. Uma simples fotografia ou tomada de vídeo não autorizada pode ensejar processo contra a Igreja. Diante desta realidade, considero importante a Igreja se precaver assumindo no estatuto o compromisso de respeitar essa lei, sendo, assim, transparente na sua relação com os fiéis, quer dando publicidade do seu estatuto, quer colocando avisos em locais de fácil visibilidade em suas dependências, informando que a Igreja possui mídias. Em certos casos, será de bom alvitre que a Igreja obtenha autorização por escrito daqueles que vão se apresentar cantando, testemunhando, pregando ou apresentando peças teatrais, por exemplo. O importante é que a Igreja se blinde contra eventuais ações judiciais. Recentemente, em uma das minhas palestras eu consultei aos presentes sobre a possibilidade de filmar o auditório para colocar em minhas mídias sociais. Pedi que ficassem de pé quem concordasse. Num universo de quase duas centenas de pessoas, apenas duas permaneceram sentadas. Resultado: fiquei frustrado, mas não filmei nem divulguei. Sugiro que as Igrejas que utilizam mídias sociais insiram em seus estatutos dispositivo que afirmam que respeitam a Lei Geral de Proteção de Dados; que deem publicidade ao seu estatuto a todos os fiéis; e que afixe em suas dependências e projeções informação com os seguintes dizeres: “Em observância à Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), informamos que esta igreja utiliza mídias sociais para transmissão de seus cultos” (Lei nº 13.709, de 14 de agosto de 2018).
4. VOLUNTARIADO: NATUREZA DOS TRABALHOS DESENVOLVIDOS EM ESPAÇOS ECLESIÁSTICOS
Este é um assunto um tanto quanto inusitado, mas que deve ser motivo de preocupação e cuidado por parte das igrejas que pretendem e necessitam reformar ou adequar os seus estatutos, ante às novidades que têm preocupado sobremaneira a sociedade religiosa no Brasil, e muito particularmente as igrejas evangélicas. Você sabia que a falta de conhecimento das leis e normas aplicadas aos templos de qualquer culto têm levado pastores e ovelhas que atuam em ambiente eclesiástico ao cometimento de verdadeiros equívocos? Sim, isto acontece quando eles pleiteiam direitos trabalhistas em âmbito extrajudicial (na igreja) ou até mesmo no âmbito judicial, quando recorrem à Justiça do Trabalho em busca de direitos que supõem ter, mas não os têm, por força na natureza dos serviços que prestam. Abro parêntese para dizer que os seminários deveriam orientar os seus seminaristas acerca das suas relações contratuais quando assumirem o pastorado de uma igreja local. O seminarista deveria saber, desde o primeiro dia de aula, que ele não tem direitos trabalhistas. Caso a igreja contratante resolva conceder-lhe direitos análogos aos dos trabalhadores celetistas, será por mera liberalidade. Via de regra, o ministro religioso não reúne os requisitos contidos no artigo 3º da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), que assim diz: “Considera-se empregada toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário”. Peguei o meu anzol e fui ao Dr. Google pescar um conceito prático e encontrei o Dr. Ives Gandra Martins Filho, que assim se expressa: “As pessoas que se dedicam às atividades de natureza espiritual a fazem com o sentido de missão, atendendo a um chamado divino e nunca por uma remuneração terrena”. Destarte, entendemos de acordo com o entendimento majoritário atual que de início já se exclui o quesito “mediante salário” tão bem lecionado no art. 3º da CLT. Não é de hoje que os Tribunais têm julgado improcedentes ações trabalhistas movidas por pastores contra igrejas. Senão vejamos: “Inexiste vínculo de emprego entre o ministro de culto protestante – pastor – e a igreja, pois o mesmo como órgão se confunde com a própria igreja. (RO. 14322 – TRT 1ª Região – 4ª Turma – Relator Juiz Raymundo Soares de Matos – Publicado no DORJ 08/10/02). “Não gera vínculo de emprego entre as partes a prestação de serviços na qualidade de pastor, sem qualquer interesse econômico. Nesta hipótese, a entrega de valores mensais não constitui salário, mas mera ajuda de custo para a subsistência do religioso e de sua família, de modo a possibilitar maior dedicação ao seu ofício de difusão e fortalecimento da fé que professa. Recurso Ordinário que se nega provimento. (RO. 17973/98 – TRT 3ª Região – 2ª Turma – Relator Juiz Eduardo Augusto Lobato – Publicado no DJMG em 02/07/1999)”. “O exercício de atividade religiosa diretamente vinculada aos fins da Igreja não dá ensejo ao reconhecimento de vínculo de emprego, nos termos do art. 3º da CLT. Recurso do reclamante a que se nega provimento. (RO 01139-2004- 101-04-00-5 – TRT 4ª Região – Relator Juiz João Alfredo B. A. De Miranda – Publicado no DORGS em 02/06/2006)”. O que ouvi de mais emblemático, não sei se fato ou boato, teria acontecido em algum estado da federação, quando em audiência de julgamento o juiz perguntou ao pastor reclamante quem era o seu patrão, ao que o pastor respondeu: “O meu patrão é Deus”. Sendo assim, vá pleitear os seus direitos com Deus” – disse o magistrado. Ainda que em igrejas históricas os casos desta natureza sejam bem mais raros, tem sido cada vez mais comum o protocolamento de processos trabalhistas movidos por pastores e membros contra as igrejas. Membros da igreja local que eventualmente ocupam cargos ou funções como diaconia, ministério de adoração, professores de Escola Bíblica, cantina, livrarias nas dependências da igreja etc. Enquanto o pastor atua em nome de uma vocação divina, os voluntários precisam saber que atividades como as acima mencionadas não ensejam reconhecimento de vínculo de emprego. Pensam ou são induzidos a pensar que têm direitos trabalhistas, mas não os têm, uma vez que não estão presentes os requisitos da lei. Neste caso, o melhor que cada igreja pode fazer é inserir artigo em seu estatuto de forma clara e objetiva quando das tratativas com o pastor no momento em que ele é investido na função, ressaltando-se que ele – pastor – não tem patrão, não é subordinado a ninguém, o seu ofício não exige pessoalidade e ele não recebe salário (recebe sustento ou provento ministerial, prebenda, côngrua, múnus eclesiástico ou outro nome que se queira dar, mas nunca salário). Já com relação aos membros, que se faça constar um artigo com redação mais ou menos assim: “Toda e qualquer atividade desenvolvida pelos membros no âmbito da igreja, tais como diaconia, ensino, liderança ou composição ministerial ou departamental, atuação em bazares, cantinas, estacionamentos, motorista de veículos da igreja, terão caráter voluntário e por isso jamais serão objeto de reclamação trabalhista ou qualquer outro direito.
É certo que haverá casos em que a igreja terá que contratar trabalhadores de acordo com os ditames da CLT, como é o caso de zeladores, auxiliares de serviços gerais, secretárias etc. Eventualmente contratará prestadores de serviços autônomos, mediante pagamento através de RPA (Recibo de Pagamento de Autônomo). Encerro dizendo que em caso de atividades laborais simultâneas ou paralelas no seu espaço eclesiástico, o pastor deverá ser devidamente recompensado em todos os seus direitos, sem a necessidade de se provocar a Justiça, pois a Bíblia nos ensina que a nossa justiça deve exceder a dos escribas e fariseus.
5. POSSIBILIDADE DE O PASTOR TITULAR NÃO OCUPAR A FUNÇÃO DE PRESIDENTE
Vamos direto ao ponto. Por tradição, ao assumir o ministério pastoral de uma igreja local, o pastor escolhido assume automaticamente o cargo de presidente, o que implica envolvimento com causas administrativas, como também responsabilidade civil. Acontece que nem sempre o ministro religioso detém habilidades para tratar de questões inerentes ao cargo de presidente, tais como admissão e demissão de funcionários, burocracias junto a bancos, cartórios, repartições públicas etc. Ora, tendo a igreja local em seu rol de membros pessoas habilitadas, muito poderá ajudar na dinâmica da igreja para cumprir a sua missão. Mas não é só por isso.
Recentemente determinada igreja recebeu uma notificação de um órgão fiscalizador, pedindo a presença do pastor-presidente no prazo designado. Não sabendo do que se tratava, perdeu noites de sono, o coração apertou e no dia determinado a caminho do órgão fiscalizador, aquele pastor passou mal, tendo que ser atendido em um pronto socorro. Há ainda outra razão para que o pastor abra mão desse “privilégio” de se tornar presidente da igreja.
De modo geral, os cargos estatutários são preenchidos em assembleia geral. É claro que não é oportuno consultar o CPF de cada indicado e eventualmente eleito, mas é importante que a igreja saiba que se um dos atores sociais eleitos estiver com alguma pendência junto ao SPC (Serviço de Proteção ao Crédito) ou Serasa, ele não poderá ocupar o cargo.
6. REALIZAÇÃO DE ASSEMBLEIAS VIRTUAIS, PRESENCIAIS OU HÍBRIDAS
Aqui estamos falando de uma novidade que chegou em face da pandemia (COVID 19). Como se sabe, tradicionalmente toda e qualquer organização regida por estatuto precisa realizar assembleias gerais para se conduzir dentro da legalidade. Isto não é invencionice nem particularidade das igrejas batistas, mas está previsto em lei. Independentemente do sistema de governo (congregacional democrático, episcopal, presbiteral ou outro), a nenhum líder religioso é dado o direito de tomar decisões monocráticas no campo administrativo, especialmente aquelas que possam repercutir no campo da responsabilidade civil ou até mesmo criminal. Até então, por força de previsão estatutária, as igrejas só podiam realizar assembleias gerais em sua sede, sob pena de nulidade das decisões tomadas. Quando em junho de 2020 o Brasil e o mundo viviam o chamado isolamento social, uma lei federal temporária criada para vigorar até 30 de outubro do mesmo ano possibilitou às igrejas a realização de assembleias virtuais, inclusive para eleger a nova diretoria, já que muitas delas estavam com o mandato vencido e em consequência disso com o certificado digital vencido. Ora, sem certificado digital, sem possibilidade de emitir folha de pagamento, sem possibilidade de apresentar declarações ao fisco, sem possibilidade de movimentar conta bancária. Algumas igrejas aproveitaram a oportunidade e outras lamentavelmente sequer tomaram conhecimento.
Atualmente, com o abrandamento da pandemia, já é possível às igrejas realizar assembleias gerais e, neste caso, é importante que o estatuto conste previsão de assembleias presenciais sim, mas também virtuais ou híbridas. Afinal, os tempos mudaram, os fiéis adotaram um novo comportamento e a igreja de Cristo precisa se contextualizar sem, contudo, se secularizar.
7. AMPLIAÇÃO DO TEMPO DE MANDATO DA DIRETORIA
Anteriormente, falei da possibilidade de as igrejas inserirem em seus estatutos atividades típicas das Organizações da Sociedade Civil (OSCs) sem risco de perda da imunidade tributária. Agora resta-me desejar ardentemente que as igrejas enxerguem essa grande possibilidade que se lhes apresenta para mudar a sua história a partir do desenvolvimento 184 de atividades sociais. Isso mesmo! Está provado que igrejas que desenvolvem atividades sociais gozam de maior credibilidade junto à comunidade em que se encontram inseridas. Hoje eu quero falar sobre o tempo de mandato da diretoria estatutária. Como se sabe, por tradição e em nome do valorizado sistema de governo congregacional democrático defendido e praticado pelos batistas e outras denominações, ainda hoje em dia prevalece o tempo de mandato da diretoria estatutária de um ano, apenas. Acontece que esse costume vem de um tempo longínquo quando praticamente não havia exigências paralelas. Explico: No passado não havia necessidade de se registrar em cartório as atas de renovação de diretoria, tampouco os bancos exigiram que essas atas fossem levadas a registro cartorial. Não havia Certificado Digital nem e-Social. Com o passar do tempo surgiu a exigência de publicação do extrato da ata de fundação e também do estatuto primitivo e eventuais alterações dele em dois jornais de grande circulação. Com o passar do tempo exigências se multiplicaram, de formas que sem ata da diretoria devidamente atualizada e registrada em cartório, a igreja não consegue dar um passo sequer. Diga-se de passagem, algumas instituições financeiras costumam rejeitar estatutos não reformados ou não adequados ao Código Civil em vigor desde 2003. Uma das primeiras alterações que Código Civil de 2003 sofreu só veio beneficiar as organizações religiosas, cujo dispositivo áureo diz o seguinte, em seu art. 44, § 1º: “São livres a criação, a organização, a estruturação interna e o funcionamento das organizações religiosas, sendo vedado ao poder público negar-lhes reconhecimento ou registro dos atos constitutivos e necessários ao seu funcionamento”. E foi isso que nos levou a refletir sobre a possibilidade de elaborarmos um estatuto mais prático, mais funcional, mais enxuto e menos burocrático, inclusive no tocante ao tempo de mandato. Feita esta introdução, apresento a seguinte sugestão: Considerando que para toda eleição é necessário reconhecimento de firmas do presidente e da secretária e o registro da ata em cartório e, com isso gera despesas, burocracia e tempo, o mandato de um ano para a diretoria deve ser descartado. Sendo assim, o ideal é que a igreja amplie o tempo de mandato para essa diretoria para dois, três, quatro ou até cinco anos. Mas atenção: os cartórios costumam divergir quanto às exigências e pode ser que um ou outro negue o registro para mandatos muitos longos.
8. QUAL É O TEMPO IDEAL DE MANDATO DA DIRETORIA ESTATUTÁRIA?
Tradicionalmente, as igrejas evangélicas preveem em seus estatutos mandato de um ano para a sua diretoria estatutária, a qual, mesmo não sendo regra rígida, quase sempre é composta de presidente, vice-presidente, dois secretários e dois tesoureiros. Pode variar para mais ou para menos. Pode a igreja, por exemplo, ter dois ou mais vice-presidentes, dois ou mais secretários e dois ou mais tesoureiros, como também pode uma diretoria ser composta apenas por um presidente, um secretário e um tesoureiro. Esta orientação tem relação direta com o princípio do direito de autorregulamentação, estampado no Código Civil, em seu artigo 44, § 1º, que diz: “São livres a criação, a organização, a estruturação interna e o funcionamento das organizações religiosas, sendo vedado ao poder público negar-lhes reconhecimento ou registro dos atos constitutivos e necessários ao seu funcionamento”. Procedendo de acordo com primeiro parágrafo acima, anualmente a igreja deve reunir-se em assembleia geral para a realização da nova diretoria e, ato contínuo, deve levar a ata de eleição a registro junto ao cartório competente, o que implica despesas e burocracia – tempo e dinheiro. Já vi casos em que a eleição ocorreu no mês de dezembro para posse em 1º de janeiro e a igreja só conseguiu o registro efetivo da ata e a alteração cadastral do CNPJ no mês de junho, ou seja, a apenas um semestre do fim do mandato da diretoria. Diante desta dificuldade reinante, a minha orientação às igrejas tem sido no sentido de alterar os seus estatutos, visando à ampliação do mandato da diretoria estatutária para 2 (dois), 3 (três), 4 (quatro) ou até 5 (cinco anos). Isto não traz qualquer embaraço para a igreja, já que se houver necessidade de substituição de um dos membros, não haverá quaisquer prejuízos, tais como impossibilidade do cumprimento de obrigações acessórias, recolhimentos de impostos e contribuições vinculados ao e-Social, à Receita Federal ou mesmo atualizações cadastrais junto a instituições financeiras, autárquicas, governamentais ou de qualquer outra natureza. E, para reforçar as informações que tenho prestado aqui, já que a igreja vai promover assembleia geral extraordinária para dilatar o prazo de mandato da diretoria, sugiro acrescentar pelo menos mais dois pontos, a saber: a) previsão de realização de assembleia geral por meio virtual, ou seja, não presencial, através de plataformas tais como WhatsApp, Zoom, Webx ou outra; e b) inserção de atividades previstas no Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil para contemplar atividades de assistência social, educação e saúde, tudo de acordo com a visão social da igreja.
Nota final: Se a sua igreja ainda incorre no erro de não dialogar com o profissional contábil contratado, não fornecendo-lhe as informações mensais necessárias para a realização da contabilidade regular, é melhor substituir o tesoureiro antes que seja tarde demais.
9. VERSÃO BÍBLICA RECOMENDADA
Creio ser esta a abordagem mais inusitada de todas as pontuadas até agora. Analisando, por exemplo, a Declaração Doutrinária da Convenção Batista Brasileira, lemos que “a Bíblia é a Palavra de Deus em linguagem humana.
a) É o registro da revelação que Deus fez de si mesmo aos homens;
b) Sendo Deus seu verdadeiro autor, foi escrita por homens inspirados e dirigidos pelo Espírito Santo;
c) Tem por finalidade revelar os propósitos de Deus, levar os pecadores à salvação, edificar os crentes e promover a glória de Deus;
d) Seu conteúdo é a verdade, sem mescla de erro, e por isso é um perfeito tesouro de instrução divina;
e) Revela o destino final do mundo e os critérios pelos quais Deus julgará todos os homens;
f) A Bíblia é a autoridade única em matéria de religião, fiel padrão pelo qual devem ser aferidas as doutrinas e a conduta dos homens;
g) Ela deve ser interpretada sempre à luz da pessoa e dos ensinos de Jesus Cristo”. Afirma tal documento que através dos tempos, um dos princípios basilares é a “aceitação da Bíblia Sagrada como única regra de fé e conduta”. Sendo assim, nos estatutos das Igrejas filiadas à Convenção Batista Brasileira necessariamente constam esse preceito, até mesmo como forma de autoproteção da instituição contra eventuais ataques de lobos que se infiltram no meio das ovelhas. Acontece que há uma fragilidade na expressão Bíblia Sagrada, pois até as pedras sabem que atualmente há versões falsificadas do Livro Santo circulando por aí. Não vai aqui qualquer crítica aos métodos tradicionais de tradução da Bíblia, quais sejam;
a) por equivalência formal (tradução de palavra por palavra); ou
b) por equivalência dinâmica ou funcional (interpretação do original por paráfrase, onde o texto não é adulterado).
O problema é quando segmentos ideológicos resolvem subtrair ou acrescentar palavras ou expressões a seu bel-prazer. Neste caso, a capa continuará a mesma (Bíblia Sagrada), mas o conteúdo certamente será a ponte que conduzirá muitos à perdição eterna. À primeira vista pode parecer uma preocupação exagerada, mas se eu fosse você tratava logo de promover a adequação do estatuto da sua Igreja e no artigo que versa sobre a “aceitação da Bíblia Sagrada como única regra de fé e conduta”, que seja a Bíblia Sagrada adotada por sua respectiva Convenção.
Jonatas Nascimento, diácono. Membro da Primeira Igreja Batista em Maricá (RJ) – Adiberj Seccional Costa Leste.