UM REI HUMILDE, ALIMENTO PARA O MUNDO
“Enquanto lá estavam [em Belém], completaram-se os dias para o parto, e ela deu à luz o seu filho primogênito, envolveu-o com faixas e reclinou-o numa manjedoura, porque não havia lugar para eles na sala.” (Lucas 2:6-7)
Refletindo, nestes dias que antecedem o Advento, sobre este pequeno e significante texto de Lucas, me saltaram aos olhos o final do versículo: “porque não havia lugar para eles na sala.” É reconhecido que na região de Belém as grutas eram – e são até hoje – usadas como estábulos para os animais. São ambientes não habitados por seres humanos, reservados aos bois, jumentos e demais animais de pasto. Ali, porém, estava Jesus, nascendo em uma gruta, longe dos pólos de poder e de reconhecimento, acompanhado tão somente por Maria e José e os animais que o rodeavam – os reis só o foram ver dois anos após e não presenciaram o nascimento tal como as pinturas nos fazem crer.
Este texto fez-me lembrar ainda as palavras de João: “veio para o que era seu e os seus não o receberam” (Jo 1:11). Para o Criador do mundo, não há lugar. Não há espaço para receber o verdadeiro Rei de Israel. Nasce no humilde ambiente dos animais do campo. Enquanto Augusto governava em Roma, o Rei da Glória dividia ambiente com os animais. Com isso devemos lembrar que o ser cristão é abdicar dos privilégios e, com Cristo, abraçar a função de servos uns dos outros. É com Cristo renascer na humildade da fé, para o serviço de nossos irmãos.
Diz-nos ainda que ele foi “envolto em faixas”, não havendo sequer roupas adequadas para o aquecer e o envolver. Reside aqui algo profundamente significativo que a tradição dos ícones ortodoxos e dos Pais da Igreja sempre enfatizaram: aqui está uma antecipação de sua morte, quando foi envolto em faixas após baixar da Cruz, tomado nos braços por sua Mãe. O caminho de Jesus estava sendo proclamado como sinal desde seu nascimento: nasce como rejeitado e morre como malfeitor. Deus quis abraçar a nossa condição integralmente, desde baixo, desde a miséria de nossa natureza. Quis participar de toda a nossa fraqueza – exceto o pecado. Nascimento e Morte, Manjedoura e Cruz – Duas cenas sobrepostas.
“Posto na manjedoura”. Agostinho interpretou curiosamente esta passagem. A manjedoura era o lugar onde os animais comiam, onde encontravam alimento. Agora aqui está Jesus, posto na “manjedoura” como alimento para o mundo, como “pão dos céus”. Eis aí a mesa de Deus para a qual são todos convidados, o banquete divino para a Vida do mundo. Na pobreza e humildade deste nascimento sagrado delineia-se a grande realidade em que, misteriosamente, já se realiza a redenção da humanidade.
Pastor Marcone Luiz Baima Pessoa Júnior
Aluno egresso do Seminário Equatorial